Documento recentemente divulgado aponta para um possível pacto entre Joaquim Chissano e elementos do regime do apartheid, visando silenciar Samora Mac


Um documento recentemente tornado público veio lançar uma nova e perturbadora luz sobre as circunstâncias em torno da morte do antigo presidente moçambicano Samora Machel, ocorrida a 19 de Outubro de 1986. O conteúdo do referido documento, que circula entre meios diplomáticos e académicos, sugere que Joaquim Chissano, que viria a suceder Machel como Presidente de Moçambique, poderá ter participado num acordo secreto com um dos ex-comandantes do regime do apartheid sul-africano com o objectivo de eliminar Machel.

O documento, classificado durante décadas como confidencial, aponta para um suposto entendimento entre Chissano e altos quadros militares do regime do apartheid, regime que vigorava na África do Sul até ao início da década de 1990. Segundo o que é agora revelado, este pacto teria como objectivo travar a influência crescente de Samora Machel, tanto dentro de Moçambique como na região da África Austral, devido ao seu apoio declarado ao Congresso Nacional Africano (ANC) e à sua postura firme contra a corrupção e os interesses económicos obscuros que começavam a infiltrar-se no aparelho do Estado moçambicano.

Samora Machel e o seu apoio incondicional ao ANC

Samora Machel era um dos mais destacados defensores da luta do povo sul-africano contra o regime segregacionista do apartheid. Durante os seus anos de governação, não só acolheu membros do ANC em território moçambicano como também ofereceu apoio logístico, político e militar a esta organização, liderada na altura por figuras como Oliver Tambo e Nelson Mandela (este ainda preso na altura da morte de Machel).

Esta posição granjeou-lhe o respeito internacional, mas também inimigos poderosos, tanto dentro como fora do seu país. No seio do regime do apartheid, Machel era visto como uma ameaça à ordem estabelecida, não apenas pela sua solidariedade com os movimentos de libertação da região, mas também pelo risco que representava ao fomentar uma revolta regional contra o domínio branco.

Uma descoberta perigosa poderá ter precipitado a sua morte

Fontes próximas do antigo líder afirmam que, pouco antes da sua trágica morte, Samora Machel teria tido acesso a informações delicadas sobre redes de corrupção dentro do seu próprio governo. Supostamente, estas redes envolveriam altos funcionários do Estado, militares e até membros do partido no poder na altura, a FRELIMO. Estas revelações, se tornadas públicas, poderiam ter abalado profundamente a estrutura de poder instalada.

O documento agora revelado sugere que Machel estaria a preparar um conjunto de reformas drásticas para combater estas práticas e reestruturar o aparelho do Estado. Esta atitude, embora louvável, poderá ter alarmado determinados sectores que viam os seus interesses ameaçados, incluindo figuras de peso dentro do governo moçambicano.

As circunstâncias misteriosas da queda do avião presidencial

Samora Machel perdeu a vida num acidente de aviação quando o avião em que seguia, proveniente da Zâmbia, caiu nas montanhas de Mbuzini, perto da fronteira entre Moçambique, Suazilândia e África do Sul. Desde o primeiro momento, existiram suspeitas de sabotagem. A versão oficial do regime sul-africano na altura atribuía o acidente a erro humano e a problemas de navegação, mas investigações posteriores — incluindo uma conduzida por peritos internacionais — nunca conseguiram dissipar completamente as dúvidas quanto a uma possível interferência externa.

Nos anos que se seguiram, muitos apontaram para a possibilidade de o regime do apartheid ter utilizado tecnologia de guerra electrónica para desviar o avião do seu curso, algo que viria a ser conhecido como a “teoria do falso farol”. O novo documento parece corroborar esta tese, mas vai mais longe, implicando directamente figuras do governo moçambicano da altura no plano.

Joaquim Chissano e o alegado envolvimento no plano

A figura central desta nova revelação é Joaquim Chissano, que servia como Ministro dos Negócios Estrangeiros na altura da morte de Machel e que assumiria a presidência poucos dias depois da tragédia. De acordo com o documento, Chissano teria mantido encontros discretos com representantes do regime do apartheid meses antes do acidente, durante os quais teria sido discutida a possibilidade de remover Machel do poder, de forma a “preservar a estabilidade regional” e facilitar acordos económicos e diplomáticos com a África do Sul.

Estas alegações, se confirmadas, colocam em causa toda a narrativa construída ao longo das últimas décadas sobre a transição de poder em Moçambique e podem reabrir velhas feridas ainda não saradas no seio da sociedade moçambicana.

Consequências políticas e históricas

A divulgação deste documento poderá ter implicações sérias tanto para o legado de Joaquim Chissano como para a história recente de Moçambique. Chissano, que até hoje é amplamente respeitado a nível internacional pelo seu papel na estabilização do país após a guerra civil, poderá ver a sua imagem profundamente manchada caso se venham a confirmar estas acusações.

Ao mesmo tempo, esta revelação poderá alimentar pedidos de reabertura de investigações formais à morte de Samora Machel, tanto em Moçambique como em instâncias internacionais. Várias organizações da sociedade civil já começaram a mobilizar-se, exigindo que o governo moçambicano esclareça os factos e permita o acesso público aos arquivos ainda classificados relativos ao acidente.

Apelos à verdade e à justiça histórica

A família de Samora Machel, bem como antigos combatentes da luta de libertação, têm vindo a clamar por justiça há décadas. Agora, com a circulação deste documento, renasce a esperança de que a verdade venha finalmente à tona. Para muitos moçambicanos, Samora Machel continua a ser um símbolo de integridade, nacionalismo e entrega ao povo. Descobrir a verdade sobre a sua morte é não apenas um acto de justiça histórica, mas também um passo essencial para a reconciliação nacional.