Governo de Daniel Chapo recorre a tractores agrícolas para colmatar falhas no transporte público  população reage com revolta e acusa Executivo de improvisação

Maputo, 19 de Julho de 2025 Uma sequência de fotografias e vídeos, partilhados massivamente nas redes sociais desde o início da semana, expôs uma realidade que tem deixado o país incrédulo: em várias zonas rurais e bairros periféricos de Moçambique, autocarros e carrinhas de transporte colectivo foram substituídos por rudimentares reboques puxados por tractores agrícolas. A decisão, assumida como solução temporária pelo governo liderado por Daniel Chapo, desencadeou uma onda de indignação, críticas acerbas e protestos nas ruas e no espaço digital.

Moradores de Chókwe, Xai‑Xai, Inhambane e partes da província de Sofala relatam que, desde o fim‑de‑semana passado, crianças em idade escolar, grávidas, doentes e idosos são obrigados a viajar em plataformas de metal descobertas, sem bancos, sem cintos de segurança e sem cobertura contra sol ou chuva. Em alguns casos, os passageiros sentam‑se directamente sobre sacos de fertilizante vazios ou tentam equilibrar‑se em pilhas de palha, enquanto o tractor segue por estradas esburacadas a velocidades irregulares.

Estamos a ser tratados como mercadoria. Falavam de progresso e modernização, mas agora viajamos ao relento, empoleirados em tratores”, desabafou, à imprensa local, Maria António, residente de Chidenguele, depois de um percurso de 25 quilómetros até ao centro de saúde.

Governo fala em “medida transitória cidadãos vêem “insulto à dignidade

Confrontado com as primeiras imagens, o Ministério dos Transportes e Comunicações explicou, em comunicado, que o recurso a tractores é “uma estratégia emergencial para minimizar os impactos de uma grave escassez de autocarros” provocada, segundo a tutela, por avarias sucessivas na frota estatal e por constrangimentos orçamentais. O Executivo garante que “está a trabalhar para repor o serviço normal nas próximas semanas” e apela à “compreensão dos utentes”.

As justificações, porém, convenceram poucos. Analistas de mobilidade urbana lembram que o défice no sistema de transporte público é crónico e que sucessivos relatórios do Tribunal Administrativo sublinham falhas na manutenção da frota, corrupção em contratos de importação de autocarros e atrasos na construção de terminais rodoviários. “Chamar‑lhe provisório é tapar o sol com a peneira; é mais uma evidência de ausência de planeamento”, critica a engenheira de transportes Celina Matsule, da Universidade Eduardo Mondlane.