Carta aberta denuncia alegada conivência da Presidente do Conselho Constitucional com a FRELIMO e acusa-a de trair a vontade do povo nas últimas eleições.


Excelentíssima Senhora Presidente do Conselho Constitucional, Lúcia Ribeiro,

Dirijo-me a Vossa Excelência não com títulos ou cargos importantes, mas com a legitimidade de ser um dos muitos jovens moçambicanos marginalizados por um sistema que parece ter abandonado os princípios da justiça, da transparência e da democracia. Sou apenas mais uma voz entre milhões, sufocada pelo peso da exclusão e pela ambição desmedida daqueles que deveriam servir o povo e não os seus próprios interesses.

Escrevo-lhe esta carta pública, num gesto de desespero e indignação, para manifestar o sentimento de revolta que cresce nas entranhas de uma juventude que já não se revê nas instituições do Estado. Senhora Presidente, permita-me dizer, com todo o respeito que a sua posição exige, mas sem hipocrisia: Vossa Excelência traiu o povo moçambicano ao colocar os interesses da FRELIMO acima da vontade popular.

A dor que atravessa este país não é abstrata. É real. Vê-se nas famílias que choram entes queridos vítimas de violência política, nos jovens que perdem a esperança por falta de oportunidades, nos cidadãos que enfrentam a cada dia o peso do custo de vida galopante, enquanto a classe dirigente continua indiferente. Vê-se nos corpos que tombam sob balas disparadas por forças que deveriam proteger, e não reprimir.

Senhora Lúcia Ribeiro, o povo moçambicano sente-se traído. As eleições gerais mais recentes foram, para muitos, um exemplo claro de manipulação e violação da vontade do eleitorado. Acreditamos, com base em evidências apresentadas por diversos sectores da sociedade civil e da oposição, que o candidato Venâncio Mondlane venceu essas eleições. No entanto, Vossa Excelência, numa demonstração de fidelidade partidária e não constitucional, validou um processo que muitos consideram viciado e ilegítimo.

O papel do Conselho Constitucional deveria ser o de guardião da legalidade e da vontade soberana do povo. Contudo, a sua actuação revelou parcialidade e conivência com um regime que tem sido associado a práticas autoritárias, perseguições políticas e corrupção endémica. A sua postura pública, longe de tranquilizar os cidadãos, fortaleceu a percepção de que a justiça em Moçambique está capturada.

Sem o seu aval, Senhora Presidente, é possível que a FRELIMO não conseguisse perpetuar-se no poder como o fez. A sua chancela conferiu legitimidade institucional a um processo fortemente contestado, contribuindo para o agravamento da crise política e social que vivemos. E, por isso, muitos responsabilizam-na directamente por ajudar a consolidar um sistema que continua a reprimir, censurar e silenciar.

Aprendemos, infelizmente, uma dura lição: em Moçambique, o voto popular não decide eleições. O verdadeiro poder de decisão está nas mãos de instituições como o Conselho Constitucional e a Comissão Nacional de Eleições, dominadas por interesses obscuros e alheios à vontade do povo.

Lamentamos profundamente que Vossa Excelência, em vez de ser símbolo de integridade e independência, se tenha tornado, aos olhos de muitos, numa figura associada à máfia política instalada no poder. A sua responsabilidade histórica neste momento não pode ser ignorada. A memória colectiva não esquecerá os nomes dos que contribuíram para enterrar os sonhos democráticos de uma nação inteira.

E não falamos apenas em termos abstractos. Referimo-nos concretamente às vítimas da repressão — nomes como Elvino Dias, Paulo Guambe, entre tantos outros que deram a vida por uma Moçambique livre, justa e verdadeiramente democrática. O seu silêncio, Senhora Presidente, perante essas tragédias, é ensurdecedor. E a sua actuação, cúmplice de um sistema violento, será recordada por gerações.

Não se trata de mero desabafo. Trata-se de um grito por justiça. Um apelo por dignidade. Um protesto contra a indiferença. E, acima de tudo, um exercício de cidadania de quem ainda acredita que Moçambique merece mais e melhor.



Fontes:

👉 UC7Vidas

👉 Unay Cambuma – 7lifes