Mnangagwa aposta no aliado milionário para garantir sucessão e proteger o seu círculo de influência, enquanto Chiwenga enfrenta dilema político e militar.
O empresário zimbabueano Kudakwashe Tagwirei, conhecido pelo seu envolvimento em contratos milionários com o Estado e por estar sob sanções internacionais, foi nomeado membro do Comité Central do ZANU-PF. Esta nomeação coloca-o numa posição privilegiada para suceder ao presidente Emmerson Mnangagwa, tornando-se potencialmente o seu herdeiro político, a menos que o vice-presidente, o general Constantino Chiwenga, avance de forma decisiva para impedir tal cenário.
A alteração constitucional que eliminou a cláusula do “companheiro de corrida” – que obrigava Mnangagwa a escolher formalmente o seu vice-presidente como candidato abriu espaço para uma disputa interna mais intensa. Desde então, analistas políticos têm advertido que Chiwenga, caso queira chegar ao topo, terá de lutar pelo poder de forma aberta e estratégica.
Neste momento, a leitura mais lógica é que Mnangagwa conseguiu cercar politicamente o seu vice-presidente, restringindo-lhe margens de manobra. No entanto, a batalha não está perdida para Chiwenga, a menos que ele próprio decida não entrar em confronto. A grande incógnita reside no apoio das forças armadas: sem o respaldo militar, a sua posição enfraquece drasticamente. Do outro lado, Tagwirei conta com recursos financeiros vastíssimos, investindo quantias colossais para pavimentar o seu caminho até à presidência.
Entre os apoiantes mais fervorosos de Tagwirei encontra-se a esposa do comandante da Guarda Presidencial, unidade militar que desempenhou um papel central no golpe de 2017. Este detalhe alimenta especulações sobre divisões dentro do próprio exército, já que oficiais têm sido acusados por elementos próximos de Chiwenga de receberem pagamentos diretos de Tagwirei.
A importância desta jogada para Mnangagwa vai além da política. Ele e a sua família temem processos judiciais e eventuais investigações após deixarem o poder. A ascensão de Tagwirei é vista como um “escudo” para proteger não só o presidente, mas também as redes de influência e os cartéis económicos que orbitam em torno do seu círculo próximo, incluindo figuras como George Guvamatanga, Ziyambi Ziyambi, Virginia Mabhiza, Vimbai Nyemba, entre outros.
Chiwenga, por sua vez, mantém-se como uma figura enigmática. Pouco se sabe sobre a sua equipa política ou estratégia, algo que poderá ser deliberado para confundir aliados e adversários. Diplomatas estrangeiros que tentaram sondar a sua posição em temas sensíveis não obtiveram respostas claras, reforçando a imagem de um jogador calculista ou, segundo alguns, de um líder desorganizado.
Mnangagwa não se tem limitado ao território nacional. Tem investido intensamente em relações diplomáticas na região, enviando emisários como Wicknell Chivayo para negociar acordos e assegurar apoios estratégicos junto de líderes influentes. Com este trabalho prévio, um golpe militar contra si parece improvável. A lição de Robert Mugabe, que poderia ter travado o golpe de 2017 se não estivesse debilitado pela idade, está bem presente. Mnangagwa pretende evitar repetir esse erro.
O caminho de Chiwenga é, portanto, longo e repleto de obstáculos. Porém, sendo um militar experiente, não se descarta a possibilidade de recorrer a soluções radicais, seguindo exemplos de golpes na região do Sahel, onde novos líderes tomaram o poder sem procurar validação internacional.
Caso Chiwenga não opte por lutar, é provável que a próxima etapa seja uma tentativa de afastá-lo completamente do poder – momento em que, talvez, o “verdadeiro” Chiwenga se revele. Apesar de não ser considerado um líder carismático, beneficia da impopularidade crescente de Mnangagwa, odiado por grande parte da população devido à grave crise económica e social no Zimbabué.
Sem capacidade para mobilizar as bases do ZANU-PF de forma eficaz, Chiwenga terá apenas duas opções: ou arrisca um golpe de Estado, ou verá o seu percurso político chegar ao fim
Enviar um comentário
Enviar um comentário